SOBRE UM MUSEU AUSENTE // 2017 [scroll down for english version]
por Gabriel Bogossian_
Em 1953, o mexicano Juan Rulfo lançou seu único romance, Pedro Páramo. O livro narra a história de Pedro, um senhor de terras do interior do México que, aos poucos, chega a dominar toda a pequena cidade de Comala. A narrativa começa com a evocação da fala de uma moribunda: Juan Preciado, filho de Pedro e Dolores, parte rumo à Comala após a morte da mãe, e lembra, chegando lá, da descrição feita por ela de sua cidade natal.
Juan não conhece o pai nem Comala; a justaposição de imagens e o contraste produzido entre eco da memória e visão no presente ocorre logo nas primeiras páginas, uma alternância temporal que funciona como uma montagem em paralelo e reproduz, neste trecho, um recurso que é uma das principais marcas formais do romance.
A chegada em Comala é anticlimática: logo Juan nota que a cidade está morta, assim como a maior parte de seus moradores. São seus espectros sem descanso que relatam a Juan fragmentos da história de Pedro e daquele lugar. O jogo de tempos entre o relato fantasmagórico do presente e esses fragmentos, narrados a partir do passado, temos uma imagem da figura violenta e caprichosa desse senhor de terras, em cujo transcurso de vida ocorre a Revolução Mexicana (e com qual ele, como um personagem de Lampedusa, se alia), que no entanto desiste, após conquistá-lo, do seu pequeno império.
Em Rulfo, como na Odisseia, é a voz do espectro que narra o lugar de origem – a terra pátria, ou seja, dos antepassados –, permitindo com isso reter uma imagem e elaborar daí alguma espécie de retorno. O Museu Inexistente vol. 1, projeto realizado em parceria com Victor Leguy, sai também em busca dessas vozes. Articulando uma reflexão sobre os discursos oficiais em torno do patrimônio artístico e histórico, a memória visual do indigenismo paraestatal e a produção artística contemporânea, buscamos criar um museu fictício, pensado contra o fundo da ausência de um museu do contato, que fosse capaz de narrar criticamente a história da relação entre as sociedades indígenas e nós outros, não-indígenas, no Brasil.
E não é só a partir da literatura que os mortos falam: Benedict Anderson inicia seu clássico estudo sobre a construção das comunidades nacionais com a evocação de um fantasma; para ele, são espectrais também as imagens que aglutinam as narrativas da nação, esse lugar de origem ampliado e pleno de significados. Ao longo do estudo, Anderson insiste sobre o "poder imaginativo do nacionalismo"; seria preciso esquecer diversos aspectos do passado – "esquecer bem as coisas" – a fim de imaginar – imaginar bem, diríamos – uma certa ideia de nação. No jogo de apagamentos e afirmações que organiza esses imaginários nacionais, o museu tem um papel-chave: para além do caráter político da "imaginação museológica", os inventários produzidos por essas instituições alinham diferentes tipos de itens em séries heterogêneas, com vistas a espelhar o patrimônio de uma comunidade que se imagina a partir dali. É o patrimônio que cria a comunidade, portanto, e não o contrário.
Ao lado dos museus históricos, os museus de arte se destacam na elaboração desses repertórios. É neles que a "imaginação museológica" se manifesta mais livremente, reproduzindo de modo indistinto, lado a lado, narrativas ficcionais e históricas e compondo um só repertório de grande continuidade visual a partir desse cruzamento. É por seu caráter profundamente político que o museu foi tomado, em diferentes momentos do século 20, como objeto de investigação não só de artistas e curadores, mas também de filósofos e ensaístas. Em Museu Valéry-Proust, Adorno aborda o museu como objeto capaz de refletir modos de acessar certa tradição cultural, enquanto André Malraux imagina um museu impresso, que reuniria os principais acervos museológicos do mundo. O título do livro de Malraux ecoa, anos mais tarde, no da obra de Hans Hollein, The imaginary museum, instalação apresentada na Documenta 8 na qual as legendas de pinturas exemplares da história da arte europeia são apresentadas na escala das obras que legendam, enquanto as obras são mostradas padronizadas, no tamanho de suas legendas. Além de Hollein, outros artistas abordaram o museu como tema, e em 1999 o MoMA realizou a exposição The Museum as a Muse reunindo a produção de 59 deles, dentre os quais Marcel Broodthaers, Andrea Fraser e Hans Haacke.
Contemporaneamente, as narrativas museológicas disputam espaço com um enorme repertório de outras narrativas, em muitos casos mais gratificantes e atrativas em sua tarefa de produzir sentido. Em The museum in the age of mass media, Boris Groys, retomando um tema que ecoa ao fundo no texto de Malraux – o museu na era da mídia de massa –, defende a importância do museu como detentor da memória histórica que permitiria diferenciar passado e presente e estabeleceria, a partir de seu limite interior, o limiar do contemporâneo. Essa defesa, sintomática talvez do desejo de conter a lenta diminuição do prestígio de museus e outras instituições de arte que não se massificam, não leva em conta a necessidade de submeter essas mesmas instituições a releituras críticas de suas narrativas ainda mais radicais do que as empreendidas até agora. No que concerne à memória oficial elaborada a partir do patrimônio artístico e histórico, instituições civis e estatais passaram a partilhar com os museus o papel de narradores privilegiados. No caso brasileiro, o gesto de "incorporação de heranças políticas" que Anderson aponta como uma das funções dos museus no contexto do nacionalismo está presente também nas políticas de patrimônio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). A escala de sua atuação faz com que, ao lado dos principais museus nacionais, o Instituto ocupe o papel de importante fonte para as narrativas que nos aproximariam de "um lugar das origens" nacionalmente comum. Fruto da imaginação do nacionalismo modernista, tal projeto de origem comum que o modernismo quis criar sugeria a ideia de um destino igualmente comum, em uma dinâmica histórica onde a continuidade entre esses dois momentos seria garantida pelos acervos dos museus, as listas de patrimônio e pelas narrativas que elas promovem.
Tal como os museus estudados por Anderson, o IPHAN produz diferentes inventários e listas, que serializam nosso patrimônio nacional. Integrando itens a elas, o Instituto torna equivalentemente importantes Brasília e os profetas de Aleijadinho, nos indicando desse modo os herdeiros daquele patrimônio. Em suas primeiras décadas, no entanto, a comunidade imaginada pelos intelectuais e burocratas responsáveis pelo IPHAN pairou sobre a comunidade real, produzindo em relação a ela alguns contrastes importantes. No que diz respeito ao escopo deste ensaio, a principal delas foi a formidável insistência em exotizar e folclorizar práticas culturais populares, produzindo – ideias fora de lugar – um pensamento patrimonial estetizante e europeizante, que admitia analisar certas práticas desvinculadas das relações sociais e modos de vida que as fundavam. Tamanho descolamento em relação à comunidade real só começou a ser abordado criticamente com a criação, por Aloisio Magalhães, do Centro Nacional de Referência Cultural (1975) e depois, no fim dos anos 2000, com a instituição do Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial e a criação do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial. O Programa busca atender aos artigos 215 e 216 da Constituição, que preveem a proteção de manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras (215) e o reconhecimento dos bens culturais imateriais como patrimônio a ser preservado pelo Estado, "com a colaboração da comunidade", promovendo e protegendo o Patrimônio Cultural Brasileiro por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento (216).
Apesar dos lentos porém significativos avanços realizados nos debates sobre o patrimônio imaterial, no que diz respeito à relação entre as nações indígenas e essa nação outra que as circunda, o Estado brasileiro foi incapaz de elaborar uma situação discursiva que permitisse reunir de modo articulado as histórias dessa convivência. Essa incapacidade talvez seja parcialmente explicada pela contemporaneidade premente da presença indígena, cuja permanência impede o distanciamento museológico necessário ou desassociá-la de conflitos pela propriedade da terra. Muito distantes dos domínios da história e demasiadamente próximos dos da política, os povos indígenas no Brasil são imaginados ao mesmo tempo dentro e fora desta comunidade nacional, em um lugar instável, a partir do qual não é possível narrar as ambiguidades violentas dessa relação. Diante desse histórico, alguns museus e memoriais espalhados pelo país se dedicam reunir, de maneiras diferentes, indícios dessa presença fugidia. Além dos museus de arqueologia, antropologia e etnologia, três instituições se destacam nesse panorama, graças às particulares narrativas que agenciam.
O Museu Histórico e Pedagógico Índia Vanuíre (MHPIV), em Tupã (SP), foi criado em 1966 por Luiz de Souza Leão, pernambucano que fundara a própria Tupã 37 anos antes. Com seus eixos temáticos – história local e etnografia – definidos pelo mesmo Souza Leão, o museu celebra a história da cidade sem ignorar a presença indígena na região; a própria cidade, afinal, reconhece essa presença, e, desde seu nome até os nomes das ruas de seu centro histórico, faz uma série de vagas homenagens a indígenas genéricos. O MHPIV carrega marcas dessa perspectiva generalista ao mesmo tempo em que busca se alinhar a abordagens mais sofisticadas da presença indígena na região: por um lado, seu nome é uma homenagem torta, fazendo referência a uma kaigang que teria sido levada à região pelo SPI a fim de servir como intérprete no processo de atração e aldeamento dos grupos kaigang que viviam ali e que, segundo a lenda, subia em um jequitibá de dez metros para entoar cânticos de paz; por outro, o acervo do museu é representativo das culturas materiais Kaigang e Krenak, que vivem na região, tendo contado com a colaboração de representantes dos dois povos na catalogação da coleção e realizando exposições com curadores indígenas.
Projetado por Oscar Niemeyer, o Memorial dos Povos Indígenas em Brasília foi construído em 1987. Sua forma redonda busca evocar uma maloca Yanomami, mas tal característica não impediu o prédio de ser transformado em museu de arte moderna logo após a inauguração. Retomando sua função original em 1999, tem o acervo basicamente composto pela doação feita por Darcy e Berta Ribeiro de 382 peças dois anos antes. Embora sirva de palco para eventos protagonizados por indígenas, o Memorial paira como um monumento descarnado, casca vazia que não relembra aquilo que celebra. O Museu do Índio, por seu turno, no Rio de Janeiro, tem sua personalidade institucional disputada pelas inúmeras demandas que é chamado a atender. Guardando, dentre diversas outras coleções, o acervo audiovisual produzido pelo major Thomaz Vaz, da Comissão Rondon, o Museu do Índio funciona na prática como um híbrido de museu do indigenismo, museu etnográfico e museu indígena, se levarmos em consideração as ações realizadas por diferentes povos junto à instituição. A presença de uma loja vendendo "artesanato indígena" nas suas dependências torna ainda mais problemático identificar o lugar a partir do qual suas falas são enunciadas e confere à instituição a incômoda marca de "museu da Funai".
Além desses museus e memoriais, há, aqui e ali – nas feições da estatuária das Missões ou no grafite de Nunca – traços da presença indígena na produção artística brasileira. Crescente nos últimos anos, essa produção do contato (ou seja, que reconhece a existência indígena) também narra, a seu modo, fragmentos dessa convivência entre nações que ocorre no interior das fronteiras brasileiras. A reflexão sobre ela, no entanto, é limitada, e ocorre mais em estudos de antropologia visual do que a partir do campo da arte.
Imagem do século 19 – que representou um indígena pobremente conhecido, mas visível, em caricaturas, relatos de viagem, fotografias e pinturas –, Moema (1856), de Victor Meirelles, talvez seja, dentre as imagens fundadoras de um hipotético repertório indigenista, a primeira grande imagem do contato na arte brasileira. Contemporâneo do indigenismo literário que florescia em torno ao IHGB, o quadro dá importância desproporcional a um personagem secundário de Caramuru (1781), de Santa Rita Durão. No poema, Moema segue a nado, com outras índias, a nau que leva Caramuru e Paraguaçu para a Europa, onde ela se converterá ao cristianismo e se casará com ele. A imagem da índia morta marca uma presença definida negativamente, que, no interior do poema, funciona como contraponto ao sucesso de Paraguaçu e signo do fim do mundo indígena que não se associa à tradição europeia. Na tela de Meirelles, o cadáver apodrece sozinho na beira do mar, como uma espécie de memento mori indianista. Moema, morta com os seios para cima, amarelada, ressurge de seu papel coadjuvante como ícone de uma ambição e um desejo penalizados.
Além da pintura indianista, o século 19 se serviu também da fotografia para ver os índios. Vindas de comissões de exploração organizadas pelo governo, mas também de iniciativas independentes de fotógrafos autônomos, as fotografias são marcadas inicialmente por um olhar exotizante, além de responderem a limitações técnicas que obrigavam à realização dos retratos dentro do "espaço cênico" do estúdio. Como nos conta Fernando de Tacca no artigo O índio na fotografia brasileira: incursões sobre a imagem e o meio, a fotografia do novecentos foi aos poucos se aproximando do registro etnográfico, sem, no entanto, se aproximar da reflexividade que seria desenvolvida pela então emergente escola cultural norte-americana, nem abandonar a necessidade de reafirmar a ideia de superioridade racial; algumas fotos do período seriam, segundo Tacca, registros de práticas abusivas do "domínio do corpo de nativos como espetáculo visual e com grau elevado de superioridade na condução da produção fotográfica". Apesar da riqueza dispersa dessas experiências e de ser possível conceber, a partir da história da arte, coleção imaginada da representação indígena, não houve, no campo da arte, da museologia ou da história, uma tentativa de sistematizar de maneira crítica e transdisciplinar a memória possível dos nossos contatos; o museu que produziria esse relato, no fim, permanece ausente.
Constituído em dois momentos – a exposição de Victor Leguy que leva o nome do projeto e este texto –, o Museu inexistente vol. 1 surge contra o fundo dessa ausência. O projeto, financiado pela Funarte como parte de suas ações de fomento à arte contemporânea, tinha inicialmente a intenção de mapear os principais acervos fotográficos, audiovisuais e antropológicos que contivessem material relativo aos Enawenê-Nawê, de maneira a identificar uma história das imagens que servisse como base para refletir sobre a inclusão do Yaokwá, ritual Enawenê, no Livro das Celebrações, um dos livros de tombo que formam a lista do patrimônio imaterial brasileiro. O projeto previa uma exposição e um ensaio, buscando articular certas discussões sobre patrimônio nacional, a memória visual do indigenismo paraestatal e a produção artística contemporânea e refletir sobre o museu enquanto forma discursiva, através de seus dispositivos expográficos, e palco para as disputas em torno da construção oficial da memória.
No cruzamento discursivo buscado, o Yaokwá é um caso exemplar: inscrito no livro das celebrações em 2010 a partir de processo proposto pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) quatro anos antes, fora também objeto de um célebre documentário dirigido pela antropóloga Virgínia Valadão (1952-1998), Yãkwá, O banquete dos espíritos (1995), além de integrar, desde 2011, a lista do Patrimônio Imaterial da Unesco. O filme de Valadão foi coproduzido pela OPAN e pelo Centro de Trabalho Indigenista (CTI) e é parte do trabalho desenvolvido por ela e Vincent Carelli no Vídeo nas Aldeias desde 1985, mostrando pela primeira vez ao mundo não-indígena a bela e complexa teatralidade do ritual Enawenê.
Uma vez que a narrativa oficial sobre a cultura, nesse caso, produzira uma exceção no que diz respeito às políticas públicas relativas ao patrimônio cultural dos povos indígenas, nos interessava lançar luz sobre a história das imagens dessa inscrição, buscando investigar como foi possível imaginá-la. A série bem sucedida de esforços que a tornou possível fez com que um relativamente breve conjunto de imagens (algumas centenas de fotografias e um filme) pudesse constituir uma narrativa com algum – ainda que tênue – peso político. Para compreender a história dessas imagens, foi necessário acessar parte da história do indigenismo paraestatal, levando em conta como ele vem articulando, a partir das porosidades do Estado, diferentes maneiras de fomentar a resistência nas disputas a favor dos direitos indígenas. Mais que simular uma continuidade cultural entre os mundos indígena e não-indígena, portanto, nosso interesse foi contemplar a descontinuidade entre eles, sem descuidar das reentrâncias e saliências que conformam esse intervalo. O Museu Inexistente vol. 1, por isso, não deixa de questionar lateralmente a impressão de continuidade que certas produções no campo da arte – obras de arte, mas também exposições, filmes, etc. –, parecem querer projetar, como se ela fosse dada (bastando ser descoberta, ou revelada) e sobretudo necessária.
A pesquisa que antecedeu a realização da exposição e deste texto foi realizada entre outubro de 2016 e março de 2017 nos acervos do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), no Rio de Janeiro; do Instituto Socioambiental e do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, em São Paulo; e da OPAN, em Cuiabá. Partindo das descrições do território, refizemos o trajeto histórico de aproximação que resultou no contato com os Enawenê-Nawê, realizado em julho de 1974 pelos jesuítas Thomaz Aquino Lisboa e Vicente Cañas.
Lisboa fora um dos fundadores do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), órgão da Igreja católica criado em 1971 – quatro anos depois, portanto, da dissolução do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e sua substituição pela Funai –, quando a gestão de Mário Andreazza no ministério dos Transportes promovia uma ampla expansão da malha rodoviária nacional que teve como consequência uma série igualmente ampla de contatos mal estruturados e mal planejados, realizados principalmente pela Funai.
O CIMI nasceu, como várias outras iniciativas do indigenismo paraestatal, das lacunas deixadas pelo indigenismo estatal. Atuando sob o sol da Teologia da Libertação, o indigenismo católico fez, quinze anos antes do seu equivalente estatal, uma importante autocrítica sobre a atuação histórica da Igreja junto aos povos indígenas e propôs um gesto duplo de renovação – metodológica e política – no desenvolvimento dessa atuação. Apesar dos atritos provocados com o governo e com alas conservadoras da Igreja, os religiosos envolvidos no Conselho tiveram um papel decisivo no fortalecimento da resistência indígena autônoma, por meio da promoção dos primeiros encontros de lideranças indígenas de diversas regiões do país.
No que concerne à metodologia de contato, a autocrítica elaborada por Lisboa e outros buscou não reproduzir as principais falhas dos procedimentos então praticados pela Funai. As principais preocupações eram evitar a transmissão de doenças e o abandono dos povos recém contatados à própria sorte. O relato minucioso da aproximação e do contato com os Enawenê-Nawê é feito por Thomaz Aquino Lisboa em seu livro Os Enauenê-Nauê. Primeiros contatos. Amazônia matogrossense, 1974: os primeiros contatos com um povo verdadeiro e a sua luta pela terra, cuja primeira edição é de 1985.
O livro tem como base o diário de campo produzido por Lisboa, traduzido em uma prosa bem construída e comedida no uso de recursos expressivos, que faz na maior parte das vezes uma descrição cuidadosa dos eventos. É, ainda, a primeira fonte de imagens dos Enawenê-Nawê, pois a preparação minuciosa que Lisboa fez do contato incluía levar câmeras de fotografia e filmagem desde o primeiro momento.
O livro de Lisboa apresenta também a figura de Vicente Cañas (1939-1987). Missionário espanhol radicado no Brasil, onde chegara em 1966, Cañas já fizera um contato bem-sucedido com os Myky, junto com Lisboa, e a partir de 1975 se tornou figura-chave para os Enawenê, cumprindo um importante papel de mediação em sua relação com o mundo não-indígena. Por ele, Cañas foi assassinado em 1987, e os seis acusados pelo crime não foram, por motivos diversos, condenados.
Os mapas consultados no IHGB cobrem um período que vai de 1754 – 35 anos depois da fundação da cidade de Cuiabá – a 1969 – 5 anos antes do contato com os Enawenê-Nawê – e eram relativos à região do Mato Grosso. Começar a pesquisa por uma mapoteca histórica foi um modo de assinalar uma vez mais a relação entre a "questão indígena" e a conquista do território. Embora esta mapoteca não possa ser tomada como a única referência para a história da representação cartográfica da região, o encontro de uma série temporalmente tão extensa de mapas permitiu elaborar uma panorâmica da visão sobre aquela região, central para a rota – tantas vezes repetida – que saía de São Paulo e seguia em direção ao Pará.
Nessa série, foi possível observar o surgimento e as transformações das divisões políticas sobre a região por meio do progressivo desenho de fronteiras, limites e divisas, além de nomes e outros signos da ocupação da região, que aos poucos vai dando contornos a um território até então – da perspectiva daquela cartografia – anônimo e sem face. Assim, um território anônimo e sem face, vai ganhando contornos na medida em que é conquistado e explorado. Conforme aprimoram a qualidade da sua descrição, os mapas, enquanto sínteses de informações sobre a região, começam a indicar alguns dos povos indígenas que habitam as partes oeste e norte do Mato Grosso, além das atividades econômicas desenvolvidas ou por desenvolver em cada área do estado. Seria necessário, para esta pesquisa, produzir novos mapas, complementando a série cartográfica com descrições do desenvolvimento cronológico da presença de missões religiosas na região e indicações dos ciclos de expansão das fronteiras agrícolas.
No acervo do ISA, se destacam as imagens produzidas por Vincent Carelli ao longo de inúmeras visitas à TI Enawenê-Nawê. Em maior quantidade que a produção de qualquer outro autor, o conjunto de imagens de Carelli mostra principalmente a preparação para o Yaokwá – produção de adornos, alimentos, barragem de pesca – e sua execução. Há também uma expressiva presença de registros de crianças brincando e de retratos. Além dessas fotos, o ISA guarda também imagens produzidas por Bartolomeu Melià, jesuíta e antropólogo espanhol radicado no Brasil desde 1977 com importante atuação no campo da educação indígena. Melià fez parte do grupo de jesuítas que trabalhou junto aos Enawenê-Nawê nos primeiros anos após o contato e as imagens documentam sua presença em território enawenê.
O acervo da OPAN é, sem surpresa, o mais extenso e completo dentre os consultados. Com imagens produzidas desde o primeiro contato, ele cobre todos os períodos dessa relação, sendo composto por variadas mídias e formatos, incluindo diferentes tipos de impressão fotográfica, slides, negativos, etc. Nesse amplo e heterogêneo conjunto, é possível reconhecer o rigor das anotações de Lisboa, que organiza algumas das imagens mais antigas, minuciosamente datadas. Há também registro das inúmeras atividades desenvolvidas pela OPAN junto aos Enawenê, que incluem atendimento médico e odontológico, apoio na autodemarcação e fiscalização do território e seu entorno, alfabetização, monitoramento da fauna da região, exposições de "artesanato" Enawenê e encontros políticos de diversos tipos. O acervo inclui também registros da dinâmica cotidiana da aldeia (com especial atenção à Casa das Flautas), das várias etapas de preparação do Yãkwa, de algumas expedições de pesca e uma breve documentação de adornos e outros objetos.
O Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, por fim, não possui, em suas coleções etnológicas, nenhum item relativo ao povo Enawenê-Nawê. As sete peças presentes em seu acervo são parte da coleção Banco Santos, temporariamente sob a guarda do museu, e foram adquiridas em Cuiabá, na loja ArtÍndia, em 2004.
A fim de sistematizar as imagens levantadas em períodos, é possível propor uma organização que as agrupa em 5 capítulos ordenados cronologicamente:
1. pré-contato (1500-1974), com mapas diversos representando a região da atual TI Enawenê-Nawê e do seu entorno;
2. contato: primeiros anos (1974-1985), com imagens produzidas pelo grupo de jesuítas que acompanhou os Enawenê nos primeiros anos após o contato, primeiras notícias sobre o povo nos jornais e a documentação produzida pela Missão Anchieta para o processo de demarcação da TI, tendo como marco final o livro de Thomaz Aquino Lisboa, Os Enauenê-Nauê. Primeiros contatos...;
3. demarcação (1986-1996), incluindo toda a documentação produzida por outros agentes durante o processo de demarcação da Terra Indígena Enawenê-Nawê – dossiês e diários das equipes de antropólogos responsáveis pela demarcação, notícias de jornal, correspondências e laudos – e o documentário Yãkwá, O banquete dos Espíritos, além das imagens e do inquérito policial relacionado ao assassinato de Vicente Cañas, até a homologação da TI, em 1996. Deste período faz parte também o evento, de uma maneira geral pertinente, representado pela promulgação da Constituição de 1988 e as poderosas imagens associadas a ele;
4. O banquete dos espíritos (1997-2010), cobrindo os anos posteriores à realização do filme de Valadão e à demarcação até a inscrição do Yãkwa no Livro de Registro de Celebrações, incluindo o segundo registro audiovisual do ritual – Yaõkwá, um patrimônio ameaçado –, dirigido por Vincent Carelli e Leonardo Sette. Outros registros do ritual são deste mesmo período, mostrando os vários aspectos da sua preparação – pesca, produção de alimentos e ornamentos e a própria execução da celebração –, além das atividades relacionadas à autodemarcação e à vigilância da TI Enawenê e um extenso conjunto de registros do cotidiano na aldeia e das atividades desenvolvidas pelos Enawenê em territórios não-indígenas;
5. contato atual (2011-2017): abrangendo o período posterior ao registro do Yãkwa, esse recorte avança até o presente, em busca de reconhecer a imagem dos Enawenê produzida contemporaneamente.
Embora breves em volume, os acervos mapeados apresentam uma documentação detalhada sobre os Enawenê-Nawê são detalhados. Um amplo conjunto de fatores faz com que esse material não circule com facilidade; mesmo O banquete dos espíritos, marco luminoso nesse silêncio, ou o filme dirigido por Sette e Carelli, são de difícil acesso. Somado a isso, o reconhecimento das limitações da pesquisa – que incluiria idealmente acervos militares e antropológicos, além do acervo do CIMI e os dos principais periódicos em circulação no Brasil na segunda metade do século 20 – trouxe o produtivo dilema sobre o que tornar visível na exposição realizada.
Um museu, idealmente, dá a ver muito; fala de modo articulado sobre sua coleção, produzindo discursos sobre o passado e o futuro possível a partir dela. Este, no entanto, é um museu que recusa: antes de ver ou mostrar algo, ele busca perguntar o que veríamos realmente, se houvesse algo para olhar; o que conseguiríamos enxergar além do prazer visual provocado por plumárias e outros adornos, que dificilmente contariam com uma apreensão conceitual à altura da sua presença e função social.
Essas questões, derivadas do processo de pesquisa, foram base para o museu fictício apresentado na Funarte. Podendo ser tomado como uma espécie de lugar beckettiano – pois, sublinhando o aspecto de cena teatral ou de palco para a encenação de passagens históricas, típico dos museus, seu espaço foi ocupado por questionamentos sobre a possibilidade de encenar algo – o Museu Inexistente aproximou-se do repertório da crítica institucional para criar um meta-museu, que busca repensar o lugar de onde é possível narrar um contato. Contra a ausência do museu do contato, é como se fosse necessário reaprender a falar, pausadamente, deixando enormes espaços vagos para que, além da dúvida (sobre o que e como falar), tenha lugar também um silencioso gesto de recuo, necessário neste contexto de tantas – e tão pouco ouvidas – vozes.
Apresentado como instalação que ocupava todo o espaço expositivo, o museu era dividido em quatro módulos principais – plataformas com rodas que se elevavam a 30 centímetros do chão e eram desenhadas como esquinas de uma sala, com duas paredes em ângulo de 90º –; posicionados a 120 centímetros das paredes do espaço, permitiam a circulação nos corredores formados entre estas paredes, de alvenaria, e as dos módulos, de madeira, e deixavam também uma cruz vazia no centro do espaço. Os módulos, como pequenos palcos, organizavam dessa maneira o espaço e ecoavam os lugares de luz e sombra elaborados por cada peça do Museu.Não se tratava, contudo, de clássicas peças museológicas, mas de releituras de dispositivos expográficos que mostravam não as peças de uma hipotética coleção, mas os contornos de suas ausências; nos corredores entre módulos e paredes, caixas usadas em transporte de obras e sobras das madeiras e pallets utilizados na construção do Museu produziam uma imagem instável, como se a qualquer momento aquela estrutura pudesse ser desmontada e encaixotada. Nesse sentido, o Museu Inexistente pode ser tomado como gérmen de um museu por vir.
O Museu foi inaugurado com 7 dispositivos e sem nenhuma informação textual. Sua descrição, na forma de um breve inventário, é esclarecedora sobre os modos de operar desta imaginação museológica e suas relações com a pesquisa realizada. À direita da entrada, o primeiro módulo mostrava Deslocamento de acervo por 30', dispositivo constituído dois projetores lado a lado, direcionados para duas pequenas telas. As imagens que produziam, no entanto, continham somente os números de registro de duas das sete peças da coleção Banco Santos sob a guarda do MAE-USP. Em sentido anti-horário, o módulo seguinte continha Dio.rama, um diorama desmontado e vazio. Seu fundo, onde estaria a paisagem da cena representada, estava pintado de preto, e os vidros que protegeriam as peças ausentes, compondo a vitrine do diorama, estavam deslocados, posicionados no corredor atrás do módulo. Seguindo o trajeto, Álbum e Dissecação de uma possível (i)realidade eram compostas por duas séries de quadros, afixadas ao terceiro módulo por estruturas de madeira. A primeira, uma espécie de mostruário de reserva técnica, era base para a série de quadros que mostrava, emoldurados em sanduíches de vidro, um envelope pardo semelhante aos usados nos acervos consultados durante a pesquisa. Os vidros de cada sanduíche eram gravados em branco, de um lado trazendo trechos de textos sobre os Enawenê e do outro diagramas antropológicos que esquematizavam a organização espacial (física e metafísica) deste povo.
Álbum, no mesmo módulo, continha reproduções em grafite e carvão de algumas imagens publicadas no livro de Aquino Lisboa, das quais foram subtraídos os personagens presentes nas imagens originais. O desconforto produzido por essas ausências não deixava de provocar, mesmo nos que não conhecem as imagens fonte da obra, o estranhamento frente a uma imagem sem objeto, diante da qual é impossível não notar uma falta.
No último módulo, Imaginativo evocava os primeiros dispositivos usados para exibir a imagem em movimento, trazendo uma intervenção sobre o filme dirigido por Sette e Carelli a partir da qual só era possível ver as mãos dos indivíduos retratados no filme original. O recorte dá enorme destaque ao áudio e aos cantos realizados durante o ritual, assinalando também o labor manual necessário à sua realização e à construção do universo material dos povos indígenas.
Entre os módulos 3 e 4, a Constituição de 1988 aparece em dois momentos, que fazem referência à sua importância não só no que diz respeito às políticas de patrimônio, mas também aos direitos indígenas. No primeiro, 6 de seus exemplares formavam uma escada que levava a lugar nenhum. No segundo, um flipbook feito a partir de outro exemplar mostrava um círculo preto que, página a página, se expandia, até impedir totalmente a leitura do texto constitucional. As duas peças, posicionadas em relação a uma grande caixa de madeira, evocam as promessas não cumpridas relacionadas aos direitos e às culturas indígenas contidas na Constituição.
A essas camadas de silêncio e invisibilidade, soma-se o espaço vazio central, crucial para a configuração do Museu. Ele serviu como lugar para as conversas e encontros que foram parte das ativações da obra, configurando-se portanto como espaço de evocação das inúmeras falas que emergiram do processo de pesquisa, e que incluem não só os relatos indigenistas ou as outras informações diretamente ligadas aos Enawenê, mas também narrativas pessoais, igualmente capazes de iluminar a reflexão proposta, na medida em que relatavam o processo de ocupação de vastas regiões do Centro Oeste e do Norte brasileiro durante o governo militar. Coletados principalmente em Cuiabá, esses relatos descrevem, a partir de uma perspectiva individual porém autoconsciente de sua dimensão histórica, a migração de uma família de agricultores do sul do Brasil para o Mato Grosso.
O Museu Inexistente não deixou de ser informado por essas pequenas ficções individuais, que compõem também um todo historicamente pertinente. Sua base documental, no entanto, foram os repertórios de imagens produzidos pelo indigenismo paraestatal durante seus anos de atuação junto aos Enawenê-Nawê. Por se servirem de diversas estratégias e atuarem simultaneamente em várias frentes, os diferentes grupos que o constituem produziram conjuntos de imagens no geral assimétricos, que apesar disso permitem reconstituir não só alguns dos principais momentos da história do contato, mas também depreender as estratégias e algo da metodologia mobilizadas na produção dessas imagens.
A articulação entre as várias frentes dessa espécie de mídia tática operada pelo indigenismo paraestatal enfrenta e preenche os vácuos do Estado sem descuidar do diálogo com interlocutores internacionais, importante para o financiamento de suas atividades; de modo perspicaz, portanto, esse indigenismo vem acessando diferentes dispositivos de suporte e preservação, desde aqueles no interior da máquina pública, para garantir uma rede de proteção constituída por múltiplos apoios. Com tal gesto, são sublinhadas não só as ambiguidades do Estado no que concerne aos direitos indígenas, mas também a ambígua percepção que o mundo não indígena tem desses povos. Nessa espécie de guerrilha discursiva, é fundamental buscar novas maneiras de sensibilizar a opinião pública e mobilizar o maior número possível de vozes para fazer frente às "máquinas discursivas" postas em operação por certos grupos sociais, por parte da mídia e pelo próprio Estado.
Enquanto museu fictício, não etnográfico e não indígena, o Museu inexistente buscou, a partir de alguns poucos documentos, maneiras de evocar a história do contato com os Enawenê-Nawê. O aparato que dá forma a essa busca é o museu possível: silencioso e de poucos recursos, é como um museu feito de puro relato. O enorme espaço vago que ele indica ilumina não só o evento mote desta investigação – a presença do Yãkwa na lista do IPHAN –, mas também a história das imagens que o fundamenta e todo um amplo repertório de narrativas que se desenrolam em paralelo, subterrâneas. Ativar a ausência ruidosa da existência indígena nos nossos relatos culturais é uma tentativa de apontar o grande elefante; um gesto a mais no sentido de chegar a conhecer, como diz Todorov, a totalidade de que somos parte.
Gabriel Bogossian
abril de 2017
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ABOUT AN ABSENT MUSEUM // 2017_
Gabriel Bogossian
In 1953, the Mexican Juan Rulfo released his only novel, Pedro Páramo. The book tells the story of Pedro, a landlord from the Mexican countryside who, little by little, comes to dominate the entire small town of Comala. The narrative begins with the evocation of the speech of a dying woman: Juan Preciado, son of Pedro and Dolores, leaves for Comala right after his mother’s death, and when he arrives there, remembers the description she made of her hometown.
Juan does not know his father or Comala; the juxtaposition of images and the contrast produced between the echo of memory and the vision in the present occurs immediately on the first pages, a temporal alternation that functions as an assemblage in parallel and reproduces in this passage a feature that is one of the main formal characteristics of this novel.
The arrival in Comala is anticlimactic: Juan immediately notices that the city is dead, as are most of its inhabitants. It is its relent- less specters who tell Juan fragments of the story of Pedro and the place. The time game between the phantasmagoric account of the present and these fragments, narrated from the past, give us a picture of the violent and capricious figure of this landlord; in the course of his life, the Mexican Revolution occurs (in which, like a character from Lampedusa, he becomes an ally).
In Rulfo, as in the Odyssey, it is the spectrum’s voice who narrates the place of origin - the homeland, that is, of the ancestors - thus allowing with this the retention of an image and elaborating some kind of return. The Inexistent Museum vol. 1, a project carried out in partnership with Victor Leguy, also goes out in search of these voices. Articulating a reflection on the official discourses around the artistic and historical patrimony, the visual memory of the parastatal indigenous and the contemporary artistic production, we tried to create a fictitious museum, thought against the background of the absence of a museum of contact, that would be able to critically narrate the history of the relationship between indigenous and non-indigenous peoples in Brazil. And it is not only in the literature that the dead speak: Benedict Anderson begins his classic study on the construction of national communities with the evocation of a ghost; for him, the images that agglutinate the narratives of the nation are also spectral, that place of origin amplified and full of meaning. Throughout the study, Anderson insists on the “imaginative power of nationalism”; it would be necessary to forget several aspects of the past - “forget things completely “ - in order to imagine - to imagine properly, we would say - a certain idea of nation. In the game of erasures and affirmations organized by these national imaginaries, the museum has a key role: in addition to the political character of the “museological imagination”, the inventories produced by these institutions align different types of items in heterogeneous series, with a view to mirror a community’s patrimony which is imagined from there. It is the patrimony that creates the community, therefore, not the other way around.
Alongside the historical museums, the art museums stand out in the elaboration of these repertoires. It is in them that the “museological imagination” manifests itself more freely, reproducing in an indistinct way, side by side, fictional and historical narratives, and composing a single repertoire of great visual continuity from that intersection. It is because of its deeply political character that the museum was taken, at different times of the 20th century, as an object of investigation not only by artists and curators, but also by philosophers and essayists. In the Valéry- Proust Museum, Adorno approaches the museum as an object capable of reflecting ways of accessing a certain cultural tradition, while André Malraux imagines a printed museum that would bring together the world’s leading museological collections. The title of Malraux’s book echoes, years later, in Hans Hollein’s The Imaginary Museum, an installation presented at Documenta 8, in which the cap- tions of exemplary paintings in the history of European art are presented in the scale of the works that they explain, while the works are shown standardized in the size of their captions. In addition to Hollein, other artists approached the museum as a theme, and in 1999, MoMA held the exhibition The Museum as a Muse bringing together the production of 59 of them, among them Marcel Broodthaers, Andrea Fraser and Hans Haacke.
Contemporaneously, museological narratives vie for space with an enormous repertoire of other narratives, in many cases more gratifying and attractive in their task of producing meaning. In The Museum in the Age of Mass Media, Boris Groys, returning to a theme that echoes in the Malraux text, defends the importance of the museum as holder of the historical memory that would allow to differentiate past and present and would establish, from its inner limit, the threshold of the con- temporary. This defense, perhaps symptomatic of the desire to contain the slow decline of the prestige of museums and other non-mass art institutions, fails to account for the need to subject these same institutions to critical re-readings of their even more radical narratives than those undertaken so far. With regards to the official memory elaborated from the artistic and historical patrimony, civil and state institutions began to share with the museums the role of privileged narrators. In the Brazilian case, the “incorporation of political inheritances” that Anderson points out as one of the functions of museums in the context of nationalism is also present in the patrimony policies of the National Historical and Artistic Heritage Institute (IPHAN). The scale of its scope of work means that, alongside the main national museums, the Institute plays the role of important source for the narratives that would bring us closer to a nationally common “place of origins”. As a result of the imagination of modernist nationalism, such project of common origin that modernism wanted to create suggested the idea of an equally common destiny, in a historical dynamic where the continuity between these two moments would be the guarantee of the patrimony lists and the narratives they promote by the collections of museums.
Like the museums studied by Anderson, Iphan produces different inventories and lists, which serialize our national patrimony. By integrating items into them, the Institute makes equivalently important Brasília and the prophets of Aleijadinho, thus indicating to us the heirs of that patrimony. In its early decades, however, the community imagined by intellectuals and bureaucrats responsible for IPHAN hovered over the real community, producing some important contrasts in relation to it. With regards to the scope of this essay, the main one was the formidable insistence on exoticizing and turning into folklore popular cultural practices, producing – misplaced ideas - an aestheticizing and “Europeanizing” patrimonial thought, which allowed to analyze certain practices unrelated to social relations and modes of life in which they were based on. Such detachment in relation to the real community only began to be approached critically with the creation, by Aloisio Magalhães, of the National Cultural Reference Center (1975) and later, in the late 2000s, with the establishment of the Register of Cultural Goods of Intangible Nature and the creation of the National Program of Intangible Heritage. The Program seeks to comply with Articles 215 and 216 of the Constitution, which provide for the protection of manifestations of indigenous, Afro-Brazilian and popular cultures (215) and the recognition of intangible cultural assets as patrimony to be preserved by the State, “with the collaboration of the Community,” promoting and protecting the Brazilian Cultural Heritage through inventories, records, surveillance, tipping and expropriation, and other forms of caution (216).
In spite of the slow but significant advances made in the debates on intangible heritage, regarding the relation between the indigenous nations and that other nation that surrounds them, the Brazilian State was un- able to elaborate a discursive situation which would allow putting together the stories of this coexistence in an articulated way. This incapacity is perhaps partly explained by the pressing contemporaneity of the indigenous presence, whose permanence prevents the necessary museological detachment or dis- associates it from conflicts over land ownership. Far from the realm of history and too close to politics, indigenous peoples in Brazil are imagined both inside and outside this national community, in an unstable place, from which it is not possible to narrate the violent ambiguities of this relationship. Faced with this history, some museums and memorials scattered throughout the country are dedicated to gather, in different ways, evidence of this meeting presence. In addition to the museums of archeology, anthropology and ethnology, three institutions stand out in this panorama, thanks to the specific narratives they stage.
The Indian Vanuíre Historical and Pedagogical Museum (MHPIV), in Tupã (SP), was created in 1966 by Luiz de Souza Leão, from Pernambuco, who had founded Tupã itself 37 years earlier. With its thematic axes - local his- tory and ethnography - de ned by Souza Leão, the museum celebrates the history of the city without ignoring the indigenous presence in the region; the city itself recognizes this presence and, from its name to the names of the streets of its historical center, makes a series of vague tributes to generic natives. The MHPIV carries the marks of this generalist perspective while at the same time seeking to align itself with more sophisticated approaches to the indigenous presence in the region: on the one hand, its name is a crooked homage, referring to a kaingang that would have been taken to the region by SPI to serve as an interpreter in the process of attraction and settlement of the Kaingang groups who lived there and who, ac- cording to legend, climbed a ten meter jequitiba to chant peace songs; On the other hand, the museum’s collection is representative of the Kaingang and Krenak material cultures living in the region, having had the collaboration of representatives of the two peoples in cataloging the collection and holding exhibitions with indigenous curators.
Designed by Oscar Niemeyer, the Memorial of the Indigenous Peoples in Brasilia was built in 1987. Its round shape seeks to evoke a Yanomami maloca, but this characteristic did not prevent the building from being trans- formed into a museum of modern art soon after the inauguration. Resuming its original function in 1999, the collection was basically composed of the donation made by Darcy and Berta Ribeiro of 382 pieces two years before. Although it serves as a stage for indigenous events, the Memorial hangs like a faded monument, an empty shell that does not recall what it celebrates. The Museum of the Indian/Museu do Índio, in turn, in Rio de Janeiro, has its institutional personality disputed by the innumerable demands that it is called to attend. The Museum of the Indian works as a hybrid of a museum of indigenism, an ethnographic museum and an indigenous museum if we take into account the different initiatives taken by different peoples with the institution. It holds among other collections, the audiovisual collection produced by Major Thomaz Vaz of the Rondon Commission. The presence of a shop selling “indigenous handicrafts” on its premis- es makes it even more problematic to identify the place from which its lines are spelled out and gives the institution the uncomfortable brand of “FUNAI museum”. In addition to these museums and memorials, here and there - in the features of the statuary of the Missions or in the graffiti of Nunca - traces of the indigenous presence in the Brazilian artistic production. Growing in recent years, this production of contact (that is, recognizing indigenous existence) also narrates, in its own way, fragments of this coexistence between nations that occurs within the Brazilian borders. The reflection on it, however, is limited, and occurs more in studies of visual anthropology than in the eld of art.
The 19th-century image Moema (1856) by Victor Meirelles, which represented a poorly known but visible Indian in cartoons, travel ac- counts, photographs and paintings, is perhaps one of the founding images of a hypothetical Indian repertoire; the first great contact image in Brazilian art. Contemporary of the literary indigenism that ourished around the IHGB, the painting gives disproportionate importance to a secondary Caramuru’s (1781) character, by Santa Rita Durão. In the poem, Moema follows swimming, with other Indians, the ship that carries Caramuru and Paraguaçu to Europe, where she will convert to Christianity and marry him. The image of the dead Indian marks a de ned negative presence, which, inside the poem, functions as a counterpoint to the success of Paraguaçu and sign of the end of the indigenous world that is not associated with the European tradition. In Meirelles’s painting, the corpse rots alone at the edge of the sea, like a kind of Indian memento mori. Moema, dead with her breasts up, yellowed, reappears from her supporting role as icon of a penalized ambition and desire.
In addition to Indian painting, the 19th century also used photography to see the Indians. Coming from government-run exploration commissions, but also from independent initiatives by freelance photographers, the photographs are marked initially by an exotic look, besides responding to the technical limitations that forced the portraits to be taken within the studio’s “scenic space.” As Fernando de Tacca tells us in his article The Indian in Brazilian Photography: Inquiries about the image and the environment, the nineteenth century photograph was gradually approaching the ethnographic record, without, however, approaching the reflexivity that would be developed by the then emergent American cultural school, nor abandon the need to reaffirm the idea of racial superiority; some photographs of the period would be, according to Tacca, records of abusive practices of the “domain of the native body as a visual spectacle and with a high degree of superiority in the conduction of photographic production.” Despite the dispersed richness of these experiences and the possibility of conceiving, from the history of art, an imagined collection of indigenous representation, there was no attempt, in the eld of art, museology or history, to systematize in a critical and transdisciplinary way the memory of our contacts; the museum that would produce this account, in the end, remains absent.
Constituted in two moments - the exhibition of Victor Leguy that bears the name of the project and this text -, The Inexistent Museum vol. 1 arises against the background of this absence. The project, financed by Funarte as part of its actions to promote contemporary art, initially intended to map the main photographic, audio-visual and anthropological collections containing material related to the Enawenê-nawê, in order to identify the history of the images that served as basis for reflecting on the inclusion of Yaokwá, Enawenê ritual, in the Book of Celebrations, one of the books that form the list of Brazilian immaterial patrimony. The project provided for an exhibition and an essay, seeking to articulate discussions about national heritage, the visual memory of parastatal indigenism and contemporary artistic production, and to reflect on the museum as a discursive form, through its exhibition design devices, and stage for the disputes around the official construction of memory.
Yaokwá is an exemplary case of discursive intersection: included in the book of celebrations in 2010 from a process proposed by Operation Native Amazonia (OPAN) four years before, it was also the subject of an important documentary directed by the anthropologist Virginia Valadão (1952- 1998), Yãkwá, The Feast of Spirits (1995), as well as being integrated, since 2011, in Unesco’s List of Intangible Heritage. Valadão’s film was coproduced by OPAN and the Centro de Trabalho Indigenista (CTI) and is part of the work developed by her and Vincent Carelli in the lm Video nas Aldeias since 1985, showing for the first time to the non-indigenous world the beautiful and complex theatricality of the Enawenê ritual.
Since the oficial narrative on culture produced an exception regarding public policies concerning the cultural heritage of indigenous peoples, we were interested in shedding light on the history of the images of this inscription, seeking to investigate how it was possible to imagine them, over there. The successful series of efforts that made it possible meant that a relatively brief set of images (a few hundred photographs and a film) could build a narrative with some albeit tenuous – political weight. To understand the history of these images, it was necessary to access part of the history of parastatal indigenism, taking into account how it was articulated, from the porosities of the State, different ways of fomenting resistance in disputes in favor of indigenous rights. Rather than just simulating a cultural continuity between the indigenous and non-indigenous worlds, our interest was to contemplate the discontinuity between them, without neglecting the recesses and bumps that make up this interval. The Inexistent Museum vol. 1, therefore, does not cease to question laterally the impression of continuity that certain productions in the eld of art such as works of art, exhibitions, films, etc., seem to want to project, as if it were given (whether it be discovered, or revealed) and above all necessary.
The research that preceded the exhibition and this text was carried out between October 2016 and March 2017 in the collections of the Brazilian Historical and Geographical Institute (IHGB), in Rio de Janeiro; the Socio-environmental Institute and the Museum of Archeology and Ethnology of USP, in São Paulo; and OPAN, in Cuiabá. Starting from the descriptions of the territory, we reconsider the historical direction of approach that resulted in the contact with the Enawenê-nawê, carried out in July 1974 by the Jesuits Thomaz Aquino Lisboa and Vicente Cañas. Lisboa was one of the founders of the Missionary Indigenous Council (CIMI), an organ that was part of the Catholic Church created in 1971 - four years after the dissolution of the Indian Protection Service (SPI) and its replacement by Funai - when the management of Mario Andreazza in the Ministry of Transport promoted a broad expansion of the national road network, which resulted in a wide series of badly structured and poorly planned contacts, mainly carried out by Funai.
CIMI was born, like several other initiatives of parastatal indigenism, from the gaps left by the state indigenism. Acting under the infuence of Liberation Theology, the Catholic indigenism made, fifteen years before its state equivalent, an important self-criticism on the historical performance of the Church with the indigenous peoples and proposed a double gesture of renewal - methodological and political - in the development of this performance. Despite the friction with the government and conservative wings of the Church, the religious factions involved in the Council played a decisive role in strengthening the autonomous indigenous resistance by promoting the first meetings of indigenous leaders from various regions of the country.
Regarding the methodology of contact, the self-criticism elaborated by Lisboa and others sought not to reproduce the main failures of the procedures then practiced by Funai. The main concerns were to avoid the transmission of diseases and the abandonment of the newly contacted peoples to their fate. The detailed account of the approach and contact with the Enawenê-nawê is made by Thomaz Aquino Lisboa in his book The Enauenê-Nauê. First contacts. Amazon Matogrossense, 1974: the first contacts with a true people and their struggle for land, whose first edition is in 1985.
The book is based on the field diary produced by Lisboa, translated into a well-constructed and measured prose in the use of expressive resources, which in most cases makes a careful description of events. It is also the first source of images of the Enawenê-nawê, since the thorough preparation that Lisboa made of the contact included taking photographic and lming cameras from the very first moment. Lisboa’s book also presents Vicente Cañas (1939-1987). A Spanish missionary living in Brazil, where he arrived in 1966, Cañas had already made a successful contact with the Myky, along with Lisboa, and from 1975 became a key person for the Enawenê, playing an important mediating role in their relationship with the non-indigenous world. For this, Cañas was assassinated in 1987, and the six accused by the crime were not, for diverse reasons, condemned.
The maps consulted in the IHGB cover a period ranging from 1754 - 35 years after the founding of the city of Cuiabá - to 1969 - five years before the contact with the Enawenê-nawê - and those maps were related to the region of Mato Grosso. Beginning the search from a historical map collection was a way of pointing out once more the relation between the “indigenous issue” and the conquest of the territory. Although this map collection cannot be taken as the only reference for the history of the cartographic representation of the region, finding a series of maps which covered such a long period of time allowed us to elaborate an overview of the region, which was central to the route so many times travelled - from Sao Paulo towards Pará. In this series, it was possible to observe the emergence and transformation of the political divisions over the region through the progressive design of borders, boundaries and currencies, as well as names and other signs of occupation of the region, which gradually contours a territory that was until then - from the perspective of that cartography - anonymous and faceless. Thus, such territory gains contours as it is conquered and exploited. As the quality of their description improves, the maps, as syntheses of information about the region, begin to indicate some of the indigenous peoples that inhabit the western and northern parts of Mato Grosso, besides the economic activities developed or to be developed in each area of the state. It would be necessary to produce new maps, complementing the cartographic series with descriptions of the chronological development of the presence of religious missions in the region and indications of the cycles of expansion of the agricultural frontiers in order to get a more accurate picture for this research.
In the ISA’s collection, the images produced by Vincent Carelli during numerous visits to the Enawenê-nawê indigenous land stand out. More numerous than the production of any other author, the set of images of Carelli mainly shows the preparation for the Yaokwá - production of adornments, food, fishing - and its execution. There is also an expressive presence of records of children playing and portraits. In addition to these photos, the ISA also keeps images produced by Bartolomeu Melià, a Spanish Jesuit and anthropologist who has been living in Brazil since 1977 with an important role in the eld of indigenous education. Melià was part of the group of Jesuits who worked with the Enawenê-nawê in the first years after contact and the images document their presence in Enawenê territory.
The OPAN collection is without a doubt the most extensive and complete among those consulted. It contains images produced since the first contact, covering all periods of this relationship, composed of varied media and formats, including different types of photographic printing, slides, negatives, etc. In this broad and heterogeneous set, it is possible to recognize the rigor of Lisboa’s annotations, who organized some of the oldest images, accurately dated. There is also a record of the numerous activities carried out by the OPAN with the Enawenê, which include medical and dental care, support for self-demarcation and surveillance of their territory and its surroundings, literacy, monitoring of the region’s fauna, Enawenê handicraft exhibitions and different political meetings. The collection also includes records of the day-to-day life of the village (with special attention to the House of Flutes), the various stages of preparation of Yãkwa, some fishing expeditions and a brief documentation of adornments and other objects.
The Museum of Archeology and Ethnology of the University of São Paulo does not have any items related to the Enawenê-nawê people in its ethnological collections. The seven pieces in its collection are part of the Banco Santos’ collection, temporarily under museum care, and were purchased in Cuiabá, at the Artíndia store, in 2004.
In order to systematize the lifted images, it is possible to propose an organization that groups them into 5 chronologically ordered chapters.
1. Pre-contact (1500-1974), various maps representing the region of the modern Enawenê-Nawê and its surroundings.
2. Contact: first years (1974-1985), images produced by the group of Jesuits that accompanied the Ewanewê after the first contact, articles about the people from newspapers and the document produced by the Anchieta Mission for the process of demarcation of the indigenous land, having as the final mark Thomaz Aquino Lisboa’s book The Enauenê- Nauê. First Contacts...
3. Demarcation (1986-1996), including all the documentation produced by other agents during the demarcation process of the Enawenê-nawê indigenous land – dossiers and journals of the anthropological teams responsible for the demarcation, newspaper reports, correspondences and reports – and the documentary Yãkwá, The Feast of the Spirits, along with the images and police investigation re- lated to the murder of Vicente Cañas until the confirmation of the indigenous land in 1996. This period also includes the event, in a generally pertinent manner, of the proclamation of the Constitution of 1988 and the powerful images associated with it.
4. The Feast of the Spirits (1997-2010), covering the years after Valadão’s film and the demarcation until the inscription of the Yãkwa in the Record of Celebrations book, including the second audiovisual record of the ritual, Yaõkwá, A Threatened Patrimony, directed by Vincent Carelli and Leonardo Sette. Other records of the ritual are from this same period, showing the various preparations – fishing, producing the food and ornaments, as well as the celebration itself – as well as activities relating to the self-demarcation and surveil- lance of the indigenous land of the Enawenê and an extensive set of records of the daily life in the village and the activities developed by the Enawanê in non-indigenous territories.
5. Current contact (2010-2017), covering the period after the registration of the Yãkwa, this snippet advances to the present, with the aim of recognizing the contemporaneously produced image of the Enawenê.
Although brief in volume, the mapped collections provide detailed documentation on the Enawenê- Nawê. A wide range of factors means that this material does not circulate with ease; even The Feast of the Spirits, or the film directed by Sette and Carelli are difficult to access. In addition, the recognition of the limitations of the research, which would ideally include military and anthropological collections, as well as the CIMI collection and the main journals in circulation in Brazil in the second half of the 20th century, brought a production dilemma on what to make visible in the exhibition.
A museum, ideally, has a lot to see; speaking articulately about its collection, producing discourse about the past and the possible future of it. This, however, is a museum that refuses: before seeing or showing anything, it seeks to asks what would we really see, if there was anything to look at. What would we be able to perceive beyond the visual pleasure of feathers and other adornments that would hardly allow for conceptual apprehension to the level of its social presence and function. These questions, derived from the re- search process, were the basis for the fictional museum presented at Funarte. It can be taken as a kind of Beckettian place - for, underlining aspect of the stage or theatrical scene for the staging of historical passages, typical of museums, its space was occupied by questions about the possibility of staging something - the repertoire of institutional criticism to create a meta-museum, which seeks to rethink the place from which it is possible to narrate a contact. Against the absence of the museum of contact, it is as if it were necessary to relearn to speak, slowly, leaving huge vacant spaces so that, in addition to the doubt (about what and how to speak), a silent gesture of retreat also takes place, necessary in this context of so many - and so little heard - voices.
Presented as an installation that occupied all the exhibition space, the museum was divided into four main modules - platforms with wheels that rose 30 centimeters above the ground and were designed as corners of a room with two walls at 90º angle. They were positioned 120 cm from the walls of the space allowing the circulation in the corridors formed between these walls and the wooden modules. There was also an empty cross in the center of the space. The modules, like small stages, organized the space and echoed the places of light and shadow elaborated by each piece of the Museum. It was not, however, a matter of classical museological pieces, but of reexamination of the exhibition design devices which showed not the parts of a hypothetical collection, but the contours of their absences. In corridors between modules and walls, boxes used to transport works and leftover wood and pallets used in the construction of the Museum produced an unstable image, as if at any moment that structure could be disassembled and boxed. In this sense, the Inexistent Museum can be taken as the beginning of a museum to come.
The Museum was inaugurated with 7 devices and without any textual information. Its description, in the form of a brief inventory, clarifies how this museological imagination is managed and its relations with the research carried out. To the right of the entrance, the first module showed a Displacement of Collection 30‘ (Deslocamento de acervo por 30’), device consisting of two side-by-side projectors, directed to two small screens. The images they produced, however, contained only the registration numbers of two of the seven pieces of the Banco Santos collection under the care of MAE-USP. Counterclockwise, the next module contained Dio.rama, a disassembled and empty diorama. Its background, where the landscape was supposed to be depicted, was painted black, and the windows that would protect the missing pieces, composing the diorama’s showcase, were displaced, positioned in the hallway behind the module.
Further ahead, Album (Álbum) and Dis- section of a possible (un) reality (Dissecação de uma possível (i)realidade) were composed of two series of pictures, connected to the third module by wooden structures. The first, a kind of technical reserve, was the basis for the series of paintings that showed, framed in glass sandwiches, a brown envelope similar to those used in the collections consulted during the research. The glasses of each sandwich were engraved in white, on one side bringing excerpts of texts about the Enawenê and on the other anthropological diagrams that outlined the spatial (physical and metaphysical) organization of this people. Album (Álbum), in the same module, contained reproductions of some images published in the book of Aquino Lisbon in graphite and charcoal, from which the characters who were present in the original images were subtracted. The discomfort produced by these absences did not fail to provoke, even in those who do not know the source images of the work, the strangeness before an image without a subject, in front of which it is impossible not to notice a lack of something.
In the last module, Imaginative (Imaginativo) evoked the first devices used to display the moving image, bringing an intervention on the lm directed by Sette and Carelli from which it was only possible to see the hands of the individuals portrayed in the original film. The clipping gives great prominence to the audio and chants performed during the ritual, noting also the manual labor necessary for its realization and the construction of the material universe of indigenous peoples.
Between Modules 3 and 4, the 1988 Brazilian Constitution appears in two moments which refer to its importance not only in respect of patrimony policies, but also to indigenous rights. In the first, six of their copies formed a staircase that led nowhere. In the second, a flip-book made from another copy showed a black circle that, page by page, expanded, until the reading of the constitution - al text was totally impeded. The two pieces, positioned in relation to a large wooden box, evoke the unfulfilled promises related to the indigenous rights and cultures contained in the Constitution.
The central empty space is added to these layers of silence and invisibility, which was crucial for the configuration of the Museum. It served as a place for the conversations and meetings that were part of the activations of the work, thus constituting a space for evoking the innumerable lines that emerged from the research process, which include not only the indigenist reports or other information directly linked to the Enawenê, but also personal narratives, equally capable of shedding light on the proposed reflection as they related the process of occupation of vast regions of the Midwest and the Brazilian North during the military government. Collected mainly in Cuiabá, these reports describe, from an individual but self-conscious perspective of its historical dimension, the migration of a family of farmers from southern Brazil to Mato Grosso.
The Inexistent Museum has not ceased to be informed by these small individual fictions, which also make up a historically relevant whole. Its documentary base, however, was the repertoires of images produced by the parastatal indigenism during its years of acting together with the Enawenê-nawê. By using different strategies and acting simultaneous- ly on several fronts, the different groups that constitute it produced sets of asymmetrical images that, despite this fact, allow to reconstitute not only some of the main moments of the history of the contact, but also to understand the strategies and something related to the methodology mobilized in the production of these images. The articulation between the various fronts of this kind of tactical media operated by parastatal indigenism faces and fills the voids of the State without neglecting the dialogue with international interlocutors, important for the financing of its activities. So perspicaciously, this indigenism has been accessing different tools of support and preservation, including those inside the public ma- chine, to guarantee a network of protection constituted by multiple supports. With this gesture, the ambiguities of the State regarding indigenous rights are underlined, as well as the ambiguous perception that the non-indigenous world has of these peoples. In this kind of discursive guerrilla warfare, it is fundamental to seek new ways of sensitizing the public opinion and mobilizing as many voices as possible to deal with the “discursive ma- chines” put into operation by certain social groups, by the media and by the state itself.
As a fictitious, non-ethnographic and non-indigenous museum, the Inexistent Museum sought, from a few documents, ways to evoke the history of contact with the Enawenê-nawê. The apparatus that gives shape to this search is the possible museum: silent and of few resources, it is like a museum made of pure story. The vast vacant space it indicates sheds light not only on the motto event of this investigation - the presence of Yãkwa in the list of IPHAN - but also on the history of the images that underlies it, as well as an ample repertoire of narratives that unfold in parallel, underground. Activating the noisy absence of indigenous existence in our cultural accounts is an attempt to point at the great elephant; a gesture more in the sense of getting to know, as Todorov says, the totality of which we are part.
Gabriel Bogossian, April 2017